Juiz declara inconstitucional artigo da EC 103/19 que revogou as regras de transição.

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A liberdade de atuação normativa do legislador reformador não é ilimitada, sendo possível preponderar a estabilidade de norma já instituída, sob pena de afetar a previsibilidade normativa e o princípio da proteção da confiança, inerentes ao ordenamento jurídico no Estado Democrático de Direito. Com esse entendimento, a 2ª Vara Federal de Florianópolis declarou, em controle difuso, a inconstitucionalidade do artigo 35, III e IV da Emenda Constitucional 103/2019, reconhecendo a uma servidora pública o direito de se aposentar com base na EC 47/05.

 

A servidora pública civil federal estava a poucos meses de cumprir os requisitos para aposentadoria previstos na Constituição quando entrou em vigor a EC 103, de novembro de 2019. A emenda revogou as regras de transição para aposentadoria existentes, fazendo com que a data de aposentadoria da servidora passasse de 2020 para 2025.

 

Diante disso, ela entrou com ação contra a União, alegando a inconstitucionalidade do artigo 35 da EC 103/2019, que revogou as regras de transição, pois impôs condições mais gravosas para a aposentadoria integral e não observou os princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade, nem o direito adquirido dos servidores à observância das regras de transição anteriores.

 

A autora queria segurar seu direito à aposentadoria, com proventos integrais e paridade, de acordo com as regras de transição anteriores e a condenação da União ao pagamento dos benefícios previdenciários não concedidos.

 

O juiz federal Leonardo Cacau Santos La Bradbury analisou a questão de acordo com o princípio da proteção da confiança, segundo o qual restrições das prestações jurídicas sociais efetivadas pelo legislador devem passar por um juízo de ponderação entre o dano provocado e a relevância do objetivo buscado pela medida.

 

Dessa forma, a discricionariedade legislativa não é absoluta, ou seja, embora o Legislativo tenha direito de revisar as normas que consagram direitos sociais, existe certa garantia de estabilidade e previsibilidade das posições jurídicas concretizadas, afirmou o julgador.

 

Disso resulta, para La Bradbury, que as normas constitucionais sobre regras de transição e que estabelecem requisitos para a aposentadoria dos servidores públicos, além de não poderem ser revogadas do ordenamento, passam a ser resguardadas pelo princípio da proteção da confiança após sua concretização.

 

Juízo de ponderação


Em decorrência da aplicação da proteção da confiança, o juiz passou então a ponderar a finalidade da reforma previdenciária com a tutela da justa expectativa dos servidores na manutenção das regras anteriores.

 

O magistrado ressaltou que a nova regra é mais prejudicial do que as regras anteriores, porque os servidores, para terem à manutenção da integralidade e paridade, terão que contribuir por um período adicional que não lhes era exigido.

 

Quando a EC 41/2003 revogou a regra de transição prevista na EC 20/98 não levou, necessariamente, à dilação do prazo para atingir os requisitos de concessão do benefício, diferente do que ocorreu com a EC 103/2019, explicou.

 

As regras de transição da nova emenda são mais prejudiciais que as anteriores, porque servidores que ingressaram até 2003 terão que cumprir requisitos de elegibilidade mais gravosos e terão que se submeter à mesma idade da regra geral.

 

O magistrado chamou atenção para o caso concreto, em que, com a entrada em vigor das novas regras de transição da emenda, ao invés de se aposentar após sete meses, a servidora só teria o benefício após quatro anos e oito meses.

 

Assim, La Bradbury entendeu que deve ser respeitada a previsibilidade e a estabilidade das regras previdenciárias, uma vez que o dano causado pela mudança não se justifica pela finalidade da conter os danos aos cofres públicos.

 

O juízo declarou a inconstitucionalidade do artigo 35, III e IV, da EC 103/2019 e o direito da autora de se aposentar com base na EC 47/05, na medida que seus requisitos foram preenchidos. Além disso, concedeu o abono de permanência, desde a data em que os requisitos foram cumpridos.

 

A exigibilidade do entendimento prolatado ocorrerá após o trânsito em julgado da decisão, caso confirmada pelas instâncias superiores.





Fonte: ConJur 

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