VAMOS FALAR DOS DESCONTOS ASSOCIATIVOS?

Deixei, propositalmente, para falar sobre esse assunto quando as questões jurídicas já estivessem mais claras, para evitar politização, pois esse não é meu objetivo. Vamos lá: 

Nos últimos meses, veio à tona um escândalo envolvendo aposentados e pensionistas do INSS: milhões de beneficiários foram surpreendidos com descontos indevidos em seus pagamentos mensais, feitos por entidades de classe, associações e sindicatos sem qualquer autorização. A revelação expôs fragilidades estruturais no sistema de controle de consignações e desencadeou uma forte reação social e institucional. A estimativa foi de que ao menos 4,1 milhões de pessoas teriam sido lesadas, em sua maioria idosos com baixa escolaridade, que muitas vezes sequer perceberam a diminuição nos seus proventos mensais até que fosse tarde demais.


De acordo com as investigações da operação “Sem Desconto”, deflagrada pela Controladoria-Geral da União (CGU), pela Polícia Federal e pelo Tribunal de Contas da União (TCU), entidades associativas cadastradas junto ao INSS estavam realizando filiações em massa, sem a devida autorização dos beneficiários. Com o uso de sistemas integrados, dados de segurados eram utilizados para gerar autorizações falsas de desconto, muitas vezes com o apoio de servidores públicos cooptados ou negligentes. Em outros casos, aposentados relatam ter fornecido seus dados pessoais em eventos ou feiras de saúde, onde assinaram documentos sem clareza sobre sua finalidade, o que posteriormente foi usado como base para efetuar os descontos.



Com a publicização do ocorrido, entre as primeiras respostas, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) suspendeu temporariamente novos registros de descontos associativos. Em maio de 2025, o aplicativo “Meu INSS” passou a oferecer uma funcionalidade simplificada para que os beneficiários pudessem verificar os descontos aplicados e solicitar seu cancelamento de forma simples. A medida teve ampla adesão: até o fim de maio, mais de 2,9 milhões de aposentados e pensionistas haviam acionado os canais de contestação, e pelo menos 1,75 milhão já tinham formalizado pedidos de devolução dos valores indevidamente descontados.


Outra medida de grande impacto foi o anúncio, em junho de 2025, de que os beneficiários que contestaram os descontos seriam ressarcidos em parcela única, sem necessidade de acionar a Justiça ou realizar novo pedido administrativo. Assegurou-se de que todos os lesados tivessem seus valores devolvidos ainda dentro do ano de 2025. Para tanto, foram iniciados pagamentos automáticos a partir de 26 de junho, com a liberação inicial de R$ 292 milhões, referentes aos descontos realizados no mês de abril. Essa devolução ocorreu diretamente na conta bancária dos beneficiários, dispensando qualquer providência adicional. 


Outra medida importante foi oportunizar a contestação dos descontos junto aos correios, por aqueles que se sentem desconfortáveis em fazer isso via aplicativo de celular ou pelo site. 

Para evitar uma enxurrada de processos judiciais, especialmente pedindo danos morais, foi feito um acordo no Supremo Tribunal Federal, possibilitando a adesão dos segurados lesados, com ressarcimento imediato, com crédito extraordinário da União, independentemente do ressarcimento posterior pelas entidades associativas, mas sem a condenação em danos morais. Esse processo no STF não se encerrou e pode ter novos desdobramentos. 


Antes de concluir, entendo essencial fazer uma distinção entre entidades que de fato obtiveram a autorização, que prestam serviços, que disponibilizam convênios, etc, daquelas que surgiram da noite para o dia, sem qualquer vinculação com a comunidade. E nesse sentido, as pessoas que assinaram a autorização e que usufruíram da estrutura da entidade não devem pedir devolução. Refiro-me, por exemplo, a sindicatos dos trabalhadores rurais e a associações de aposentados (urbanos em geral) que de fato prestam serviços aos associados. 

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